quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

"O Estado a Que Chegámos"

Está patente desde o último Sábado, dia 1 de Dezembro, uma Exposição de Obras de Arte, na Casa das Artes em Tavira. A ideia, que parte do Cineclube, é realizar um leilão, a ter lugar no próximo Sábado, dia 8 de Dezembro, cuja receita reverterá para o apoio financeiro ao Cineclube de Tavira. E em boa hora, porventura, chega o evento.
Ideia com algum tempo de gestação, veio (também) na sequência de acontecimentos que acabam por pôr em cheque a continuidade da programação e actividade regular do Cineclube.
A Câmara Municipal de Tavira é devedora de verbas ao abrigo do protocolo entre as duas instituições, verbas essas que têm um atraso de mais de um ano. A este facto, junta-se o corte da linha telefónica do Cine-Teatro António Pinheiro (extensão camarária), e a decisão unilateral que consiste em ter o Cineclube de Tavira que retirar todo o seu espólio - e são 13 anos e meio de actividade - do interior do Cine-Teatro.
É verdade que o Cine-Teatro, recordemos, é propriedade legítima da Câmara Municipal. E é igualmente verdade, que existe um protocolo entre as duas instituições, celebrado em 2006, que definiu algumas regras: linha telefónica, utilização do Cine-Teatro, e apoio financeiro onde tem cabimento, sobretudo, a remuneração e responsabilização social por três funcionários que garantem o serviço ao público daquele espaço.
Errado. Com efeitos a partir de Janeiro de 2013, o protocolo está revogado, conforme votação em reunião de Câmara e aprovado por maioria no último dia 19 de Novembro.
Assim, sete dias depois de uma carta endereçada ao Presidente da Câmara Municipal de Tavira, abordando um conjunto de questões sobre pagamentos, funcionários, futuro do Cine-Teatro e existência ou não de uma estratégia para o Cineclube, a resposta tout court, em quatro linhas, é a revogação do protocolo.
Na prática, o que sai de todo este episódio é a eliminação das sessões de cinema  ao Domingo que, de resto, é desde que a Câmara Municipal adquiriu o Cine-Teatro, da responsabilidade da edilidade. O Cineclube apenas assumiu a sua programação e continuidade, sem outras contrapartidas.
A presença dos três funcionários está igualmente comprometida, e a Câmara Municipal não tem resposta para o facto, apesar de em reunião havida há meses, ter sido manifestada vontade em falar com essas três pessoas.
Claro que, com tal revogação, o Cineclube irá funcionar até Janeiro ou Fevereiro com sessões regulares - ininterruptas desde Abril de 1999 - à Quinta-Feira. A partir daí, a solução, em última análise, passa pela suspensão temporária da actividade, até que um clima mais consciente do papel de um cineclube, se venha, porventura, a instalar...
A imediata resposta a esta conjuntura, é contudo, o Leilão de Obras de Arte que acontecerá na Casa das Artes de Tavira, Rua João Vaz Corte Real, no próximo Sábado dia 8 de Dezembro, pelas 21:30h, e cujo lote pode ser consultado em http://www.cineclube-tavira.com/site/index.php?option=com_events&task=view_detail&agid=736&year=2012&month=12&day=01&Itemid=1.
Um abraço cineclubista
LG

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Na Terra, no Mar, a Ilha do Corvo

Esta 6ª feira chega ao Cineclube de Tavira o documentário de Gonçalo Tocha É na Terra não é na Lua.
Em ano e meio de rodagem Tocha recolheu muitas "milhas" de material, que acabou por resultar numa montagem que dá à narrativa um retrato diário.
Esta opção, resulta também da familiaridade desenvolvida com a população, o que compromete a plenitude, porventura, do retrato social anunciado, de uma comunidade que, como se lê na sinopse, conta com 450 habitantes, uma escola, um posto médico, um restaurante, um avião cada três dias.
Mas não é por isso que o trabalho de Gonçalo Tocha não tem mérito. A equipa de rodagem fez parte, afectuosamente, das famílias da Ilha  do Corvo, absorveu histórias, absorveu lágrimas e risos, que nos devolve a nós, espectadores, embrulhadas pela paisagem de mar, de terra com cheiro a verde, com as cores da Lagoa da cratera, com a imponência do Monte Gordo.
Lugares que não são da Lua, são bem na Terra, como Tocha quis sublinhar, gritando que há lugares assim, longe do bulício, dos bombardeamentos comerciais, da infestação da vida a correr. Ali, no extremo ocidental da Europa que se afunda, sobrevive o Corvo, que António Escudeiro filmou em 1977, e que na altura tinha 350 habitantes, marcados pelas histórias de existência precária e subsequente imigração.
Mas em 1977, como em 2007, ano em que Gonçalo Tocha chegou ao Corvo, os 17 quilómetros quadrados de ilha e da sua vida encerram o que José de Matos-Cruz escreveu um dia a propósito do filme de António Escudeiro (Ilha do Corvo, 1977): "dinâmica profundamente marcada pela condição impressionante da (bela) paisagem - nesta terra de futuro incerto, fora das rotas acessíveis e usuais".
Um retrato a levar em conta e para contemplar, na próxima  sessão do Cineclube de Tavira.
E ATENÇÃO! A soiré ocorre excepcionalmente na 6ª feira, dia 2 de Novembro. Como de costume, às 21:30h, no Cine-Teatro António Pinheiro.
LG

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Alô Brasil, Aquele Abraço!

















É com muita satisfação que anunciamos ter atingido a marca de dois milhões e meio de visitas ao blog, a partir de território brasileiro.

Encontrámos, por um acaso, a referência em http://urlpulso.com.br/www.cineclubedetavira.blogspot.com.
Isto significa que o blog, e sobretudo o Cineclube de Tavira, tem uma voz que se ouve muito longe, por muita gente. Significa que aqueles que não são subsidio-dependentes podem, com seriedade e algum engenho, trabalhar pela cultura, pela educação de públicos, bater o pé a muita gente e a muitos vícios instalados, projectando-se mundialmente e fazendo-se ouvir.

Assim é o Cineclube de Tavira, que com o mesmo engenho, com arte e imaginação, com inteligência, tem sabido manter-se vivo. E com eco da sua actividade em distantes paragens. Estamos todos de Parabéns.

Conhecem outro exemplo em Tavira? Ou mesmo no Sotavento? Pois...
LG

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

"Descoberto o primeiro filme a cores do Mundo"

O blog quebra o silêncio com uma nota sobre cinema mudo.
Mas mais que cinema mudo, trata-se de uma descoberta assinalável que, não sendo de ontem, pertence indiscutivelmente ao universo das marcas da historiografia de Cinema. Abaixo, poderão dar uma vista de olhos ao próprio filme e a umas quantas notas sobre o seu restauro.
Damos voz a Cláudia Carvalho, que a respeito do tema escreveu no Público de 14 de Setembro de 2012:

Foi encontrado no Reino Unido, aquele que será o primeiro exemplar de um filme a cores, datado de 1901 ou 1902. Até aqui os registos e a história do cinema relatavam que a primeira obra a ser exibida a cores tinha sido em 1909, depois de em 1906 se ter patenteado o sistema Kinemacolor, que permitia produzir películas a cor.

O filme estava esquecido há décadas dentro de uma lata e foi recentemente descoberto e restaurado no National Media Museum, em Bradford, que só agora anunciou o achado por estar em condições de exibir a película, pela primeira vez. Realizado pelo fotógrafo londrino Edward Raymond Turner, o filme, em que se vêem três meninos, possivelmente filhos de Turner, foi digitalizado de forma a poder recuperar a cor original da época. A descoberta é considerada como uma das mais importantes na história do cinema, uma vez que dá novas luzes sobre o aparecimento dos filmes a cores. “Acreditamos que isto vai reescrever a história do cinema”, disse ao The Telegraph Paul Goodman, responsável pela colecção do National Media Museum, sublinhando que “Edward Turner é o pai das imagens a cores em movimento”. “Não é um exagero. Estas são as primeiras imagens do mundo a cores em movimento.”

A morte precoce de Edward Turner, que morreu em 1903 de ataque cardíaco, não permitiu que o fotógrafo continuasse a desenvolver a sua técnica, nunca tendo passado dos testes e por isso sempre longe da vista do público. Em 1899 Turner tinha mesmo patenteado a sua prática, que se baseava em fotografar frames a preto e branco através de filtros azuis, verdes e vermelho. 

“É mesmo muito significativo, é definitivamente o primeiro filme a tentar captar as cores naturais, é realmente bonito”, disse à BBC Bryony Dixon, curadora do cinema mudo no British Film Institute (BFI), explicando que existem registos de alguns filmes a cores anteriores a 1902 mas não se tratam das cores reais, uma vez que os produtores pintavam o filme. “

Os filmes-teste de Edward Turner chegaram a Bradford há cerca de três anos para serem estudados e restaurados. Antes disso pertenciam ao museu de ciências de Londres que, em 1937, adquiriu a colecção do norte-americano Charles Urban, um pioneiro do cinema a viver em Londres e que financiou o método Kinemacolor. 

Entre os seus documentos e objectos estavam os filmes realizados por Turner. Por terem ficado esquecidos tanto tempo, sempre guardados em latas, o material de Turner foi encontrado em bom estado de conservação. O material foi encontrado por Michael Harvey, o comissário de cinema do museu londrino, que contactou os especialistas do Arquivo Nacional do British Film Institute. 

A razão pela qual este material passou despercebido tanto tempo foi, segundo Bryony Dixon, o seu “estranho formato”. “Foi filmado em 38 mm, o que é maior do que a medida standard de 35 mm e por isso não funciona em nenhuma máquina de 35 mm”, explicou Dixon, acrescentando que teve de ser criado um aparelho especial, pela dupla Brian Pritchard e David Cleveland, para que o filme pudesse inicialmente ser visto. 




quarta-feira, 8 de agosto de 2012

A Resistência Cineclubista: Leilão de Cartazes

 
Os fogos devastaram o Concelho e o Cineclube esteve debaixo de fogo. A Câmara Municipal de Tavira não fez por apoiar a organização das Mostras de Cinema de Tavira que aconteceriam em Julho e Agosto de 2012, isto é, a logística não foi acautelada, e a angariação de patrocinadores no âmbito do Verão em Tavira 2012 não foi feita, pelo que o Cineclube não teve oportunidade de organizar - a tempo - as Mostras.
A Câmara Municipal de Tavira lembrou-se - e não foi por falta de tentativas do Cineclube - do evento que tende e prova ser o mais significativo da oferta cultural de Verão em Tavira, apenas a um mês de acontecer, o que, outro remédio não houve, levou ao cancelamento das Mostras. Entre outras formas de protesto e sobrevivência do certame, resta a petição on-line contra a suspensão ad aeternum das Mostras em http://peticaopublica.com/PeticaoVer.aspx?pi=P2012N26437 (271 signatários no momento), e espera-se que as mesmas voltem em 2013, melhores que as anteriores 12 edições.
Para os supersticiosos o número é feio, e curioso é que a edição nº 13 tenha sido a sacrificada. Caso para dizer que não se acredita em bruxas, mas que as há, isso há. Até porque misteriosamente correu um pequenino mas maldoso boato que dava conta de uma estranha razão para o cancelamento das Mostras. Dizia o boato, que felizmente travámos a tempo, que a razão de não haver Mostras prendia-se com falta de pagamento de licenças para vender bebidas no evento. É tão maldoso como ignorante o(s) autor(es) de tal rumor, e simultaneamente triste que tal boato tenha origem em elementos com responsabilidade noutra associação que se diz e se quer cultural.
Mas a vida continua, e o Cineclube de Tavira também. Ao contrário de outros, que procuram promover reuniões com a Câmara Municipal de modo a procurar absorver mais dinheiro para as suas actividades, o Cineclube procura criar formas de angariar fundos para a sua subsistência e programação de cinema de qualidade em Tavira.
No próximo Domingo, dia 12 de Agosto, pelas 21:30h, terá lugar mais um leilão de cartazes de cinema, no Cine-Teatro António Pinheiro. Neste dia teria lugar o encerramento da 8ª Mostra de Cinema Não-Europeu de Tavira, altura em que , vinte sessões de cinema depois, o evento chegaria ao fim. O Cineclube assinala a data de fim de festa com uma divertida iniciativa que pode ter vantagem para todos. Parafraseando o André Viane:
"Se gostam de Cinema, se procuram decorar a vosa casa de forma original e económica, ou se procuram o presente ideal para oferecer aos vossos familiares, namoradas ou namorados, filhos ou netos, não percam este evento".
Domingo, não à tarde como no filme de António de Macedo, mas sim à noite, o cinema comemora-se no Cine-Teatro António Pinheiro.
LG

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Sem luzes e sem câmaras... Acção!!

A julgar pelos polícias, lá em cima, podia ser um filme de Constantin Costa-Garvas. A escadaria e os leões podiam ser da Odessa de O Couraçado Potemkine de Eisenstein.
Lisboa saíu à rua ontem à noite para ver cinema português frente à Assembleia da República. As escadarias de São Bento transformaram-se numa enorme plateia onde populares se juntaram à comunidade cinematográfica, para protestar contra a inexistência de concursos de apoio a produções. 
Assim, enquanto filmes portugueses são premiados nos mais importantes certames internacionais, o Estado corta em 100%, facto exclusivo da actividade cinematográfica. A Tóbis fechou o laboratório e foi vendida, o ICA está em ruptura financeira e isso significa - ou pode significar - o fim de várias casas de produção e outras empresas associadas ao audiovisual. Muitos desempregados - mesmo muitos - resultariam de tal situação.
Não admira pois, que a Associação Portuguesa de Realizadores tenha escolhido o local que escolheu para mostrar ao Poder o que não pode de maneira nenhuma acabar. José Nascimento e Patrícia Saramago trabalharam numa montagem de imagens de cerca de quatrocentos filmes portugueses. Recorreu-se às cassetes e DVD's de cada um, e os logotipos da RTP ou da Cinemateca Portuguesa eram bem visíveis, o que não foi confortável para todos. Mas guerra é guerra e na guerra vale tudo, até porque as duas entidades são tuteladas pelo Estado.
Os aplausos sucediam-se com a projecção das imagens dos actores mais estimados ou dos realizadores mais admirados, com destaque para o recém-desaparecido Fernando Lopes; e o blog aplaudiu silenciosa e solitariamente o cinema em Tavira, com Marisa Cruz fascinada com Marilyn Monroe no Cine-Tavira.
Mas o maior aplausofoi sintomático. João César Monteiro é interrogado na esquadra de polícia sobre com que finalidade quis tomar conta de um quartel. Monteiro, com sonora palmada no tampo da mesa, responde: "Marchar sobre São Bento!"
LG


quinta-feira, 3 de maio de 2012

In Memorian: Fernando Lopes, 1935-2012


Com o desaparecimento de Fernando Lopes ontem, 2 de Maio, o Cinema Portuiguês fica não só mais pobre, cliché repetido até à exaustão, mas fica sobretudo orfão.
Nas palavras do jovem realizador do recente Tabu, Miguel Gomes, o sentimento de orfandade é incontornável com a morte de um dos pais do Cinema Novo Português, porventura aquele que, entre os seus pares, mais compreendeu que o Cinema não se podia circunscrever a um modo português de fazer cinema, nem se poderia circunscrever ao próprio cinema.
Foi por essa razão que, da televisão migrou para o Cinema, mas sempre lá voltou, explorando as linguagens que o video ou a publicidade proporcionam, pondo-as em diálogo com o cinema. O blog presta a sua homenagem, recuperando a sua filmografia de uma anterior entrada, completando-a exaustivamente.
LG


1960 - The Bowler Hat
1960 - Interlude
1960 - The Lonely Ones
1961 - Marinha Portuguesa (documentário)
1961 - Ano Mundial do Refugiado (documentário)
1961 - As Pedras e o Tempo (documentário)
1962 - O Vôo da Amizade (documentário)
1962 - As Palavras e os Fios (documentário)
1962 - Este Século em Que Vivemos (documentário)
1962 - A Cidade das 7 Colinas - Marçano Precisa-se (documentário)
1964 - Belarmino
1966 - Cruzeiro do Sul (documentário)
1967 - Tejo - Rota do Progresso (documentário)
1967 - Hoje Estreia (documentário)
1969 - Vermelho, Amarelo e Verde (documentário)
1971 - Uma Abelha na Chuva
1972 - A Aventura Calculada (documentário)
1972 - Nacionalidade: Português (documentário)
1972 - Era Uma Vez... Amanhã (documentário)
1975 - As Armas e o Povo (colectivo, documentário)
1975 - O Encoberto (documentário)
1976 - Habitat (documentário)
1977 - Nós Por Cá Todos Bem
1977 - Sons e Cores de Portugal (documentário)
1979 - Lisboa (documentário)
1981 - Cantigamente (série TV, episódio 1: O Fado Operário)
1982 - Altitude 114 (documantário)
1984 - Crónica dos Bons Malandros
1987 - Matar Saudades
1993 - O Fio do Horizonte
1996 - Se Deus Quiser (documentário)
1998 - Gérard, Fotógrafo (documentário)
1998 - Lissabon Wuppertal Lisboa (documentário)
2001 - O Delfim
2001 - Cinema
2004 - Tomai Lá do O'Neill (documentário)
2004 - Lá Fora
2006 - 98 Octanas
2006-2007 - Ela Por Ela (série TV)
2008 - O Meu Amigo Mike ao Trabalho (documentário)
2009 - Os Sorrisos do Destino
2012 - Em Câmara Lenta

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Crisis for Sale

Saudações!



Por mais silencioso que o blog esteja, não deixa por isso de estar atento ao que se passa no Cineclube, na actividade cultural e na cidade do Gilão.

Na verdade, o blog vem dar sinal de vida muito a propósito dos três tópicos anteriores, para dar conta do chamado Bazar de Caridade / Jumble Sale do Cineclube de Tavira, realizado no último dia 7 de Abril, que se traduziu num êxito surpreendente e transcendente.
As vendas ocorreram a um ritmo extraordinário (os preços obviamente ajudaram), mas é preciso fazer uma análise mais aprofundada do evento.

Como muitas outras instituições e associações, o Cineclube passa por uma séria crise financeira, a qual ameaça encerrar a sua actividade por falta de verbas, apoios e condições para continuar a programar cinema e cultura.

O André Viane, como é sabido, é homem de teimosia saudável, e é a peça fundamental da engrenagem da exibição cinematográfica no Cine-Teatro António Pinheiro que, como todos sabemos, é um espaço alternativo à exibição pura e desenfreadamente comercial em Tavira.

Ora, a ideia de uma jumble sale é resultado de uma leitura do estado de coisas mas é também, e a montante, a certeza de que tal ideia teria uma receptividade muito positiva.

Não nos referimos ao montante angariado - acima das expectativas e que permite sobreviver um pouco mais - mas sim à quantidade de pessoas que gostam de cinema, que frequentam o Cineclube, que respeitam o trabalho que por cá se vai fazendo e que têm vontade de que as coisas não piorem. Deste modo, e como o André Viane frisou, o evento "demonstra claramente que as pessoas QUEREM a continuidade das sessões regulares do Cineclube".

Contudo, estas pessoas, que entregaram de bom grado objectos e utensílios postos de lado e com as mais variadas aplicações, para que o Cineclube as vendesse e realizasse verbas, apontam muito claramente para as Mostras de Cinema que o Cineclube realiza no Verão desde 2000. Tais eventos, são impossíveis de levar a efeito sem apoios mais consistentes, isto é, sem a sua integração no programa cultural de Verão do município, logo, com uma máquina financeira e logísticamente mais robusta.

Assim, a comunidade tavirense fez realçar a vontade de ter cinema de qualidade na sua cidade, e manifestou claramente que quer continuar a poder contar com a Mostra de Cinema Europeu de Tavira e a Mostra de Cinema Não Europeu de Tavira; eventos que se têm vindo a destacar no seio do programa municipal Verão em Tavira, no sentido de se evidenciarem cada vez mais como a pedra basilar deste programa.

Não é só o André Viane e os sócios-colaboradores do Cineclube que estão de parabéns. É todo o público real e potencial do Cineclube e de Cultura em Tavira. É o turista que sabe que existe um cineclube e umas mostras de cinema para fechar os seus dias nas férias de Verão. É o tavirense de raíz e o integrado na sociedade que também contribuíu, não só com objectos para venda mas também com donativos que provêm de naturais dos lugares que o André Viane já salientou e que aqui deixamos também explicitado: Alemanha, Argentina, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Estados Unidos, França, Noruega, Reino Unido, Suécia e Suíça.

A Cultura e a Globalidade respiram, de facto, em Tavira... e Viva o Cinema!

LG






























































segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Truffaut Octagenário, 1932-1984

Confessamos a desatenção. É graças ao Google, que hoje (e com muita justiça) celebra a efeméride, que verificamos que, se vivo fosse, François Truffaut celebraria hoje 80 primaveras.

Infelizmente, como é sabido, um tumor cerebral tirou-lhe a vida vai para 28 anos, interrompendo uma carreira com muito ainda para dar ao cinema francês e mundial.

Fundador do movimento Nouvelle Vague com Jean-Luc Goddard, Eric Rohmer, Alain Resnais, Jacques Rivette e Claude Chabrol; é com estes "pré-realizadores" e críticos da Cahiers du Cinéma que rompe em definitivo com o decadente cinema francês do Pós-Guerra, preso ao que restava do Realismo Poético.

Esta nova geração, está apostada em transgredir intransigentemente as barreiras canónicas narrativas, ao mesmo tempo que procura restaurar o cinema de autor. Procede-se a uma recriação da construção de diálogos os quais, tal como a montagem e a radical saída dos estúdios para rodar em exteriores, focam as impressões mais banais e quotidianas em torno das personagens, atingindo bastas vezes o cliché, satirizando ou parodiando a própria linguagem cinematográfica. Mas, e sobretudo, trata-se de um cinema que se constrói em torno da psicologia do sujeito, das suas paixões e desejos, um cinema impregnado de erotismo pungente que confronta o espectador com toda uma série de novas questões.

Todavia, e tal como outros, Truffaut distancia-se desta linha. Aproxima-se de um modelo mais classicista, o que o torna, porventura, no mais popular e admirado da sua geração. Assim, depois de Les 400 Coups, Tirez Sur le Pianiste e Jules et Jim, entre 1959 e 1962, filmes absolutamente "nouvellevaguianos"; roda Farenheit 451, obra futurista de Ray Bradburry. Com este filme e a sua notoriedade nos prémios BAFTA e no Festival de Veneza em 1966, François Truffaut internacionaliza-se definitivamente.

Em 1973 o filme La Nuit Américaine vence o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, obra cinematográfica sobre o cinema, o filme dentro do filme, transportando o espectador para o lado de dentro, arrastando-o para o lugar de realizador, de actor e sobretudo de actriz, pois Truffaut sempre dispensou à mulher um lugar destacado de observação enquanto cineasta.

Em 1977 interpreta o investigador Lacombe em Close Encounters of the Third Kind de Steven Spielberg. Este, rendendo-lhe homenagem, confessa, como Quentin Tarantino, Brian DePalma ou Martin Scorsese, a sua influência nos seus percursos.

LG


Filmografia:
1955 - Une Visite (curta-metragem)
1957 - Les Mistons (curta-metragem)
1958 - Une Histoire d'Eau (curta-metragem co-realizada com Jean-Luc Goddard)
1959 - Les 400 Coups
1960 - Tirez Sur le Pianiste
1960 - Tire-au-Flanc (co-realizado com Claude de Givray)
1962 - Jules et Jim
1962 - L'Amour à 20 Ans (sketch "Antoine et Colette")
1964 - La Peau Douce
1966 - Farenheit 451
1968 - La Mariée Était en Noir
1968 - Baisers Volés
1969 - La Sirène du Mississipi
1970 - L'Enfant Sauvage
1970 - Domicile Conjugal
1971 - Les Deux Anglaises et le Continent
1972 - Une Belle Fille Comme Moi
1973 - la Nuit Américaine
1975 - L'Histoire d'Adèle H.
1976 - L'Argent de Poche
1977 - L'Homme Qui Amait les Femmes
1978 - La Chambre Verte
1979 - L'Amour en Fuite
1980 - Le Dernier Métro
1981 - La Femme d'à Coté
1983 - Vivement Dimanche!

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Theo Angelopoulos, 1935-2012

Diz O Público que Angelopoulos "era o rosto do cinema grego, o vulto maior de uma cinematografia que permanece, para o resto da Europa, largamente desconhecida."

Ao contrário de vários outros, com Constantin Costa-Gavras à cabeça, que pertencem a um grupo de cineastas gregos em permanente "emigração nómada", como Polanski o é em relação à Polónia; Angelopoulos filmava a Grécia real, a Grécia contemporânea, ainda que por vezes a confrontasse com as suas incontornáveis raízes Clássicas.

Vencedor do Leão de Ouro em Veneza 1980 e da Palma de Ouro em Cannes 1998, Theo Angelopoulos filmava a questão do ser grego, em pequenas epopeias e odisseias que se desenrolam "dentro de um circuito frequentemente fechado", nas quais as personagens não cumprem objectivos, não chegam a lugar nenhum, utilizando com rara mestria o plano-sequência.

Continuando a parafrasear Luís Miguel Oliveira, "um dos últimos grandes estetas do plano-sequência, do plano longo e coreografado, "gramática" a que talvez não seja estranha a influência de cineastas do leste europeu". Assim sendo, em Angelopoulos pode ver-se um cinema mais oriental que ocidental, "como que exprimindo as fronteiras geográficas e culturais da Grécia".

Morreu há dois dias, perto de Atenas, vítima de atropelamento. Estava a rodar O Outro Mar...

LG


Filmografia para Cinema:

Peripeteies Me Tous Forminx, 1965

Ekpombi, 1968

Anaparastasi, 1970

Meres Tou '36, 1972

O Thiasos, 1975

Oi Kynigoi, 1977

O Megalexandros, 1980

Taxidi Sta Kythira, 1984

O Melissokomos, 1986

Topio Stin Omichli, 1988

To Meteoro Vima Tou Pelargou (O Passo Suspenso da Cegonha), 1991

To Vlema Tou Odyssea (O Olhar de Ulisses), 1995

Lumière et Compagnie, 1995

Mia Aioniotita Kai Mia Mera (A Eternidade e Um Dia), 1998

Trilogia: To Livadi Pou Dakryzei, 2004

Chacun Son Cinéma, segmento "Ce Petit Coup au Coeur Quand la Lumière s'Éteint et que le Film Commence", 2007

Mundo Invisível, segmento "Céu Inferior", 2011

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Habemus Papam

O Cineclube inaugura o ano de cinema com a exibição de Habemus Papam de Nanni Moretti. Com o novo ano e o estigma da renovação que sempre lhe está associado, veremos no Cine-Teatro António Pinheiro um Moretti que parte de uma sempre mediática renovação, a qual se traduz pela subida de um cardeal à cadeira de S. Pedro.

De um lado temos, então, um Papa que desejava não ser eleito, e que passa por uma crise existencial, recusando aparecer em público, enquanto milhares de fiéis aguardam ansiosamente que o novo Sumo Pontífice lhes acene da famosa janela do Vaticano.

Perante esta crise existencial, é convocado um psicólogo ateu (Moretti), o qual questiona a própria Fé do Papa (Michel Piccoli). O jogo que se desenrola, diálogo intenso entre o sagrado e o profano, divino e humano, drama e comédia (aqui as subtilezas de Moretti entram em evidência), tem lugar no tabuleiro da actual sociedade que, incrédula ou não, toma conhecimento de uma crise no seio da própria Igreja Católica, com uma sucessão de casos de alegada corrupção e pedofilia.

Tais factos vão deixando cair o manto divinal para deixar transparecer os interesses políticos e mundanos que sempre estiveram associados aos sucessores de São Pedro e seus colaboradores. Este é, em última análise, o interesse e o alvo do realizador. A sua filmografia é politizada, crítica, mas também intemporal. A sua riqueza é a forma como constrói esta temática com ferramentas como a leveza, o humor, a modéstia, a imaginação.

Este filme, indiscutivelmente para ver e reflectir, é irresistivelmente comparável a um clássico: The Shoes of the Fisherman, realizado em 1968 por Michael Anderson. Nesta obra, o cardeal ucraniano Kiril Lakota (Anthony Quinn) é eleito Papa, pouco tempo depois de libertado pelo governo soviético da sua condição de prisioneiro político na Sibéria. A conjuntura política é a Guerra Fria, para além de uma crise sino-soviética que ameaça explodir a qualquer momento o poder nuclear das duas potências.

O Papa Kiril I tem uma mensagem de Paz que promete pontuar o seu pontificado, enquanto ajuda o padre Telemond (Oskar Werner) a lutar contra a sua crise de Fé, sacerdote este que tem a solução para a crise entre os dois estados comunistas. Kiril I é um pacifista, é contra a ostentação por parte da Igreja, e mais humano do que o Clero imaginaria ou desejaria, ameaçando o papel secular da Igreja Católica no xadrez mundial.

Neste filme, tal como em Moretti, explora-se a humanização de alguém que se coloca, desejavelmente, próximo do divino. Várias foram as civilizações que o fizeram, divinizando imperadores, equiparando faraós a deuses. Todas elas se destruiram a partir de dentro...

Filme a descobrir ou redescobrir, o desafio é ver The Shoes of the Fisherman depois de Habemus Papam, pondo os dois em paralelo e em matéria de reflexão. 5ª feira, dia 5 de Janeiro, no nosso estimado Cine-Teatro António Pinheiro.

LG



segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

À Volta dos Livros

Bom Ano!

O blog formula os seus votos de bom 2012, ano que, paradoxalmente, se adivinha difícil. E a propósito, poderá ser paradoxal que um canal de comunicação, electrónico, ainda por cima motivado pelo Cinema, se ocupe de um assunto como o Livro. Livro. Esse objecto quase esquecido como fonte de informação, cultura, imaginação, criatividade, saber acumulado, fonte primordial (não é discutível), ultrapassado por poderosas fontes de informação, ora porque as imagens são de um poder de invasão avassalador para a mente humana, ora porque a informação - e as imagens - estão à distância de um "clic".

O Secretário de Estado da Cultura afirmou, em Outubro, que reforçaria "a política do livro com um aumento da dotação orçamental da Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas", o qual seria "seguramente superior a 100 por cento". Este reforço, para "pagamento de dívidas", asseguraria a "tradução de obras de autores portugueses no estrangeiro".

E a questão é precisamente esta. O Estado intervém na liquidação das dívidas das bibliotecas e investe na projecção de autores nacionais no estrangeiro. A acompanhar o estímulo à leitura do livro - tão querido a Francisco José Viegas - estão que medidas? A manutenção do IVA a 6% para o sector, não aquece nem arrefece. A iniciativa será então, para quem quiser e puder, do sector privado.

E aqui se enquadra a iniciativa, de louvar, de um recanto como a Lura dos Livros, que em Tavira estimula a leitura e a procura da mesma, ainda que para um público tendencialmente estrangeiro. Tem uma oferta mínima de leitura em português, mas no que respeita à oferta de Literatura Portuguesa, o número cresce notoriamente.

Uma proposta de Inverno, que o frio convida a que se procure um ambiente acolhedor. E tudo isto faz mais sentido, se tomarmos consciência de que em Tavira não há, neste momento, outra livraria. Na Lura (a propósito, este é um vocábulo esquecido, como os livros, que significa toca, refúgio), à volta dos livros, devemos reflectir um pouco sobre estas questões...

LG