sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Alice, por Tim Burton

Ontem foi o dia da ante-estreia mundial, que ocorreu simultaneamente nos Estados Unidos e na Inglaterra. O filme, Alice in Wonderland, é o mais recente devaneio do americano Tim Burton, mestre da herança expressionista das sombras e do claro-escuro, das formas retorcidas e da caracterização como protagonista, agora aplicados à obra de Lewis Carroll.
Com estreia marcada em Portugal para o próximo dia 4 de Março, o filme conta com a habitual população dos filmes deste realizador, Johnny Depp e Helena Bonham-Carter, à cabeça de um elenco que conta também com Crispin Glover, Anne Hathaway e Mia Wasikowska como protagonista.
Tim Burton é, por si mesmo, uma notícia. A sua excentricidade está posta ao serviço da 7ª Arte, filme após filme, numa obra que conta já com vários géneros cinematográficos, mas todos eles revestidos de fantasia, não bela mas sim de um violento obscurantismo por vezes perturbante. Não admira pois, que o jovem animador dos estúdios Disney se tenha emancipado como realizador de animação com o filme The Island of Doctor Agor em 1971.
No início dos anos 80 afirma-se com os títulos Luau, Hansel and Gretel, Frankenweenie e, sobretudo, Vincent. Este "pequeno" trabalho, homenagem aos sonhos de qualquer criança como de Tim Burton, povoados de fantasia, mistério, medo do desconhecido, é também uma homenagem ao actor-ícone do cinema fantástico Vincent Price, que magistralmente como só ele sabia, faz a narração desta animação de Tim Burton.
Quando o filme Tim Burton's The Nightmare Before Christmas andou pelas salas portuguesas, em 1993 e 1994, tivemos a oportunidade de conhecer Vincent, como complemento das sessões. Podemos agora, graças à tecnologia posta à nossa disposição, ver ou rever o princípio de um fenómeno chamado Tim Burton, enquanto não é tempo de irmos ao país das maravilhas.
LG

Berlinale 2010: Ende und Metropolis

Chegou ao fim a edição 60 do Festival Internacional de Cinema de Berlim. De entre um palmarés com algumas surpresas., destaca-se Honey, do turco Semih Kaplanoglu, que sensibilizou o júri pela narrativa que mostra o sofrimento interior infantil, e ganhou o Urso de Ouro.
O prémio de Melhor Actor foi atribuído ex-aequo aos actores russos Grigori Dobrigin e Sergei Puskepalis. São os protagonistas de How I Ended This Summer de Alexei Popogrebski, isolados numa estação meteorológica do Árctico, filme de características semelhantes ao melhor cinema de Werner Herzog, presidente do júri, a quem o blog já dedicou uma entrada.
O Melhor Realizador foi Roman Polanski, com The Ghost Writer, prémio recebido pelos produtores. Polanski tem grande capital de simpatia por parte da comunidade artística, efeito da sua complexa situação judicial, razão pela qual esteve ausente. O cineasta polaco, comentando o prémio, referiu com humor: “A última vez que fui a um festival de cinema fui preso”, segundo uma citação no jornal Público de 21/2/2010.
A grande notícia do Festival vem, contudo, do passado. Faz mais de oitenta anos desde que Fritz Lang deu ao mundo uma obra-prima chamada Metropolis, realizada em 1927. Há vários anos, a Cinemateca Portuguesa apresentou a mais completa versão conhecida, colaborando intensamente no restauro depois de, nos seus cofres, ter sido encontrado material desaparecido. Em 2008, no entanto, foi descoberta em Buenos Aires a mais próxima versão do original, que no seu tempo, tinha 150 minutos, antes de ganhar a etiqueta de filme maldito e perigoso no parecer da pequenez do 3º Reich.
A partir desta cópia, em 16mm, o seu restauro foi dirigido por Martin Körber da Fundação Friedrich Murnau. Após visionamento privado, Metropolis viu novamente o deslumbramento do público ao ser projectado ao ar livre, muito justamente na Porta de Brandenburgo na capital alemã, perante 2000 pessoas que o frio não moveu no último dia 12 de Fevereiro, a 6ª feira em que a obra-prima (ou uma das) de Fritz Lang re-conquistou Berlim
LG

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Os Pássaros, a Chuva e o Sting

O blog foi a Tavira e esteve na projecção de Birdwatchers - La Terra degli Uomini Rossi, juntamente com mais… 7 pessoas. Seria fácil dizer que todos os outros não sabem o que perderam, mas a verdade é que o caso é exactamente o inverso. Numa noite chuvosa que não convidava a sair de casa, o filme de Marco Bechis teve um efeito desconsolador para quem imaginava ir ver contar uma boa história sobre índios revoltados contra a regra cara-pálida das reservas.
A infelicidade bate à porta da tribo quando o aprendiz de pajé se envolve com a filha do fazendeiro, preocupado este em eliminar a presença nativa que invadiu (ou retomou) uns metros quadrados dos seus terrenos, e que por acaso é casado com uma organizadora de expedições para observação de pássaros. História com potencial? Sim, mas seria preciso uma outra direcção de actores e uma realização segura que conhecesse profundamente a situação dos índios da tribo guarani-kaiowá.
104 minutos que completaram este dia do cineclube, dia esse que pôs termo ao extraordinário efeito da água da chuva a correr pela parede do quadro eléctrico do cine-teatro. Numa altura em que corre a notícia de que talvez – para já é apenas uma possibilidade – o imóvel não vá ser demolido para outro nascer, mas sim reabilitado; a Câmara Municipal dá mostras de se preocupar com o seu património para as artes performativas (ainda bem, pois custou 270 mil contos em moeda antiga) e fez deslocar ao telhado do cine-teatro três técnicos qualificados que sabiamente ajustaram um algeroz…
O episódio permitiu ao blog a visita a áreas normalmente inacessíveis e, para quem por essas coisas se interessa, como nós, ficam imagens de um dos camarins, da teia e do telhado, não de zinco quente nem com gatos como no filme de Richard Brooks (1), mas também sem ninhos nem pássaros, tal como não os há em Birdwatchers, filme italo-brasileiro de 2008 que passou em Tavira numa noite chuvosa.
A propósito de chuva, recordámos entre outros o filme de Mira Nair Monsoon Wedding, que veio à memória debaixo de uma “monção” de música debitada pela banda que tocava “só em inglês”, e onde Gordon “Sting” Summers dominou a actuação. Na falta de cinema, houve pipas de música. Aliás, meias-pipas. Perdoem-nos o parágrafo com que fechamos, pois muito poucos – muito poucos mesmo – podem entender. Mas não resistimos…
LG
(1) Cat On a Hot Thin Roof, Richard Brooks, 1958







segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Georges Delerue - Theme De Camille - Le Mepris

Nasceu em Roubaix, França, 1925. Das dificuldades vividas durante a II Guerra Mundial e do interesse por clarinete, Georges Delerue tornar-se-ia nome incontornável da música para cinema, compositor fundamental no estabelecimento da chamada Nouvelle Vague em finais dos anos 50, inícios dos anos 60. O conservatório da sua Terra-Natal e o Conservatório Nacional levaram-no a compor peças para ballets e outras artes performativas, além de várias curtas-metragens. Em 1959 assina a primeira partitura para a 7ª Arte, La Bel Age de Pierre Kast, antes de se tornar habitual colaborador de Alain Resnais, Philippe DeBrocca, Agnés Varda, ou ainda Oliver Stone, Norman Jewison e Mike Nichols, antes de desaparecer em 1992. É com Jean-Luc Godard que assina a música de Le Mépris em 1964, que contém a mais bela composição instrumental - Théme de Camille - que o cinema já conheceu. Provavelmente...
LG

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Chanel na Passadeira Vermelha

Passa uma semana desde o anúncio das nomeações para os Óscares deste ano. Sem surpresas, Avatar lidera a lista, candidato a nove estatuetas onde, numa produção deste teor e como é costume, falham as categorias de escrita de argumento e representação.
Em compensação, The Hurt Locker, da ex-mulher de James Cameron Kathryn Bigelow, surpreendentemente com o mesmo número de nomeações, consegue candidaturas para Argumento Original e para Actor Principal. O mesmo acontece ainda com o filme de Quentin Tarantino Inglorious Bastards, com oito nomeações e a promessa de algumas surpresas… achamos nós.
Grandes actores, novos e menos novos, estão na corrida para subir ao palco do Kodak Theatre e expressar o seu agradecimento: Meryl Streep, Morgan Freeman, Jeff Bridges, Christopher Plummer, Stanley Tucci, Helen Mirren, para dar alguns exemplos. As categorias técnicas não devem oferecer dúvidas a Avatar e, no campo da animação, a tecnologia é provavelmente em sentido contrário. Isto é, The Princess and the Frog, que marca a reabertura dos estúdios de animação tradicional da Disney “tem de ser” justificado…
Mais novidades, na madrugada de 7 para 8 de Março, com apresentação de Steve Martin e Alec Baldwin, depois do interminável desfile de vedetas e seus tailleurs, acessórios, jóias, bijuteria, na passadeira vermelha que dá acesso ao Kodak Theatre, local de exibição de figurinos originais de costureiros conceituados.
Falando de moda, Coco Chanel aparece esta semana na berlinda. Nomeado justamente para o Óscar do Guarda-Roupa, surge o filme de Anne Fontaine Coco Avant Chanel. Mas, e sobretudo, esta é a semana em que o Cineclube exibe Coco Chanel & Igor Stravinsky, realizado por Jan Kounen.
A modernidade está ao rubro nos anos 10 do século XX, pouco antes de rebentar a 1ª Guerra Mundial. Chanel e Stravinsky, ambos artistas, procuram a quebra de barreiras nas suas áreas – moda e música. Coco Chanel quer a democratização da moda feminina e Igor Stravinsky quer uma redefinição dos cânones musicais. O primeiro contacto entre os dois, sem que se conheçam, dá-se quando Coco assiste à estreia de A Sagração da Primavera de Stravinsky, peça musical criticada e incompreendida na época, deixando o compositor inconsolável e a estilista em estado de motivação criativa. É já depois da guerra que os dois se conhecem, estando Stravinsky exilado em Paris na consequência da Revolução Russa, e sendo Chanel uma criadora de sucesso, desenvolvendo-se uma grande atracção entre os dois.
Kounen filma a emancipação feminina, a superior ligação da Rússia às artes e ao ensino, tendo como pano de fundo uma época de profundas mudanças na sociedade ocidental. Em paralelo, a estabilidade familiar é vista em contraponto com a vida pensada e movida ao momento e sem barreiras. Um filme de paixões, personificadas por Anna Mouglalis e Mads Mikkelsen, que dão corpo aos dois famosos criadores.
Antecedendo a Primavera que teima em não chegar, o Cineclube oferece moda, música, inspiração, vida. Vejamos pois, como os figurinos de Chanel se ligam, segundo Jan Kounen, à música de Stravinsky e, sobretudo, A Sagração da Primavera. E como o Cineclube é de Tavira, é quase obrigatório focar que este é um tema musical ligado a Tavira pelo cinema. Para quem já viu Almadraba Atuneira de António Campos, sabe como o realizador português cruzou Stravinsky com a Primavera anunciada pelos pescadores de atum que, ano após ano, tinham a alegria de participar na celebração de mais um ritual…
LG