terça-feira, 6 de outubro de 2009

Amália Rodrigues - 10 Anos

Há dez anos atrás, faz hoje anos, as férias que passava em Tavira tiveram naquele 6 de Outubro um sabor diferente. Difícil de definir, mas igual ao sabor que tem o desaparecimento de um ícone com o qual sempre convivemos, que gostando mais ou menos não se pode (nem se consegue) deixar de respeitar. A música portuguesa, no seu mais definido estilo, ficava orfã daquela que lhe moldou a forma, a textura e o som para o século XX e, quem sabe, para além dele.
Amália Rodrigues (23 de Julho de 1920 - 6 de Outubro de 1999), tinha o seu ocaso no Outono, deixando muita saudade, que ela cantou como ninguém. Palavra bem portuguesa, intrinsecamente ligada ao legado de Amália, pode vir a fazer parte da humanidade. Porquê? Porque desde 2005 que o Fado é candidato a Património Imaterial da Humanidade pela UNESCO. Fado e Saudade, indissociáveis, seriam então universais.
No entanto, e paradoxalmente, a universalidade do Fado é já uma realidade, facto e argumento que leva algumas personalidades a serem contra a proposta. É o caso do ensaísta Eduardo Lourenço, que afirma que o Fado "dispensa a honraria", uma vez que Amália Rodrigues, pela sua voz, universalizou o Fado.
Um bocadinho de Portugal para o mundo, eis o que a UNESCO oficializaria, para um país que não perde a oportunidade de se pôr em bicos de pés para aparecer no panorama universal, movido pela Saudade de tempos melhores mas invariavelmente passados.
Não como Amália, figura que prevalece como figura mundial da música e do canto, longe da pequenez lusitana. É por isso que muitos de nós se sentem bem, orgulhosos com a possibilidade levantada pela UNESCO. Sentimo-nos lembrados e representados, como cantava o António Variações: "Todos nós temos Amália na Voz".
E o cinema? Sim, também por lá passou Amália (e o fado, claro), desde que o portimonense Armando de Miranda rodou em 1947 Capas Negras, juntando Amália Rodrigues e Alberto Ribeiro, dois ícones da canção nacional. Foi o maior êxito do cinema português durante quase quatro décadas (ver imagem).
Curiosamente, o filme mais lembrado hoje em dia e do mesmo ano, é o mais bem conseguido Fado, História d'Uma Cantadeira de Perdigão Queiroga. Seguiu-se Sol e Toiros de José Buchs em 1949, em que se representa a ela própria, e o épico do mesmo ano Vendaval Maravilhoso, produção luso-brasileira de Leitão de Barros, com o pano de fundo baiano e a Abolição da Escravatura, cantado romanticamente pela poesia de Castro Alves.
Amália Rodrigues ela própria, dá colorido musical ao filme francês de Henri Verneuil Les Amants du Tage em 1954, e no ano seguinte o mesmo acontece com o filme inglês de Euan Lloyd April in Portugal.
Se Sangue Toureiro, 1958, de Augusto Fraga, tinha a particularidade de juntar dois símbolos da tradição portuguesa, juntando a Amália o toureiro Diamantino Viseu; tem também a particularidade de o fazer naquela que foi a primeira longa-metragem portuguesa a cores.
Com o Cinema Novo nascido, Jorge Brum do Canto procura filiar-se na sua estética em Fado Corrido, 1964, filme em que Amália, fadista e amante de um fidalgo, tem porventura o seu melhor desempenho na tela, acompanhando um retrato de uma certa Lisboa que não se pode ver sem ser através do olhar cinematográfico. Algo que concorre com Belarmino de Fernando Lopes, do mesmo ano, se o leitor aceitar o desafio de comparar o percurso do pugilista do segundo com o fidalgo do primeiro.
LG

Outros filmes:
1965 - As Ilhas Encantadas, de Carlos Vilardebó
1990 - Os Cornos de Cronos, de José Fonseca e Costa
1993 - Passagem por Lisboa, de Eduardo Geada
1998 - Lulu on the Bridge, de Paul Auster (E.U.A.)

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