A notícia chegou ontem directamente de Baku, Azerbeijão. A Dieta Mediterrânica é Património Imaterial da Humanidade, aprovado pela UNESCO. Croácia, Chipre, Espanha, Marrocos, Itália e Grécia estão de Parabéns, bem como Portugal, cuja candidatura foi liderada pelo Município de Tavira.
O significado e as suas repercussões e potencialidades são enormes, abrindo-se novos horizontes na defesa do património e cultura regional e local.
É também de sublinhar que esta aprovação acontece no momento em que se apanha azeitona, no momento em que os lagares estão em laboração, no momento em que o cheiro a processamento de azeitona invade algumas zonas da cidade, num ano em que a produção de azeite é forte. O Azeite reclama um lugar especial nesta distinção, de tão omnipresente que é na chamada Dieta Mediterrânica.
Eis o artigo de Sérgio C. Andrade, edição online do Público, 4 de Dezembro de 2013.
Abraços
LG
"A dieta mediterrânica é um património aberto e em expansão.
Não foram precisos mais de dois minutos para Portugal se ver novamente
registado na lista de património da UNESCO, numa decisão tomada na 8.ª sessão do
comité intergovernamental da organização que decorre em Baku, Azerbaijão, até ao
próximo sábado.
Sem discussão e sem objecções, e com o presidente da
mesa a realçar que ninguém se opunha à classificação, “até porque todos gostam
desta comida”, Portugal viu consagrada a candidatura conjunta com a Croácia e
Chipre, mas também com Espanha, Marrocos, Itália e Grécia – estes últimos quatro
países tinham já os seus nomes e a sua dieta mediterrânica inscritos nos bens
patrimoniais da UNESCO desde 2010, mas associaram-se agora aos outros três numa
candidatura renovada e mais abrangente e que foi liderada pela Câmara Municipal
de Tavira.
A decisão foi tomada a meio da tarde na capital do Azerbaijão (eram cerca de
13h30 em Portugal), logo na primeira das duas sessões reservadas para a
avaliação das três dezenas de candidaturas a esta categoria que tinham sido
aceites pelo comité da UNESCO (de uma lista inicial de seis dezenas). E se a
expectativa da delegação portuguesa, chefiada pelo presidente da Câmara de
Tavira, Jorge Botelho, era a mais optimista, o adiamento da inscrição da Escola
de Equitação de Viena, e as dificuldades sentidas pelo Brasil na classificação
da Romaria de Nossa Senhora da Nazaré, em Belém do Pará, terão criado algum
suspense.
Poucos minutos após a decisão do comité, Jorge Botelho classificava-a, em
declarações ao PÚBLICO, como “uma vitória para a comunidade de Tavira, mas
também para o Algarve e para todo o país”. O autarca realçava, no entanto, que
não era “só a gastronomia, mas todo o património da região que fica a ganhar”,
já que a segunda inscrição de Portugal na lista do património imaterial – dois
anos depois do fado – constitui uma nova oportunidade para a afirmação da
cultura do país e a sua inscrição na bacia do Mediterrâneo.
Jorge Coelho, autarca socialista, relevou ainda o facto de Tavira ter
liderado, “com sucesso, todo o processo da candidatura conjunta dos sete países
durante os últimos dois anos e meio”, e salientou o apoio de várias
instituições, nomeadamente o “Ministério da Agricultura e o Governo
português”.
À frente do grupo que organizou a candidatura esteve o sociólogo Jorge
Queiroz, director do Museu Municipal de Tavira, que, também ao PÚBLICO, e logo
após o veredicto da UNESCO, salientou “o efeito de reconhecimento planetário”
que ele vai ter. Queiroz notava que na capital do Azerbaijão estão esta semana
delegações de 116 países – “a maior representação de sempre no comité” – e mais
de um milhar de delegados.
A equipa portuguesa que defendeu a candidatura da dieta mediterrânica foi
ainda com
posta por João Begonha, adjunto da ministra da Agricultura, Rita
Brasil, do Ministério dos Negócios Estrangeiros e da delegação portuguesa da
UNESCO, e Victor Barros, coordenador da Comissão Nacional da Dieta
Mediterrânica.
A classificação foi naturalmente bem vista por responsáveis do sector da
restauração do Sul do país, que, pela voz de Júlio Arez, presidente da
Haresp-Algarve – Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal, a
classifica como “uma bela oportunidade de publicidade gratuita em todo o mundo”.
“As pessoas que nos visitam terão novas motivações para procurar os nossos
restaurantes, em vez de irem aos dos seus países ou irem comer fast
food”, acredita Júlio Arez, fazendo notar que os restaurantes portugueses
“já fazem também preços competitivos” com os das cadeias internacionais.
Quem também não põe em causa a importância da classificação é Isabel do
Carmo, médica endocrinologista. “É importante que se formalize e consagre um
padrão alimentar que é comum às várias regiões do Mediterrâneo e que pode trazer
benefícios sob o ponto de vista social e da saúde”, diz esta especialista em
doenças do comportamento alimentar. Faz notar, no entanto, que esta dieta "tem
uma base histórica complexa, visto que uma parte dos alimentos foi trazida dos
países descobertos por portugueses e espanhóis, sobretudo na América do Sul”,
além de que “sempre houve heterogeneidade do ponto de vista das classes
sociais”, lembrando que “para muitos trabalhadores, no passado, a alimentação
consistia em pão, azeitonas e vinho”.
Jorge Queiroz, responsável pela exposição Dieta Mediterrânica, património
cultural milenar, patente até Março no Museu Municipal de Tavira, faz notar
que a inscrição na lista do património “é um contrato entre a UNESCO e o nosso
país, que nos traz novas responsabilidades". Entre elas está o reforço da
salvaguarda da dieta mediterrânica e de toda a cultura que ela encerra.
Por outro lado, o responsável pela candidatura diz que os sete países ficam
vinculados ao desígnio de partilhar e alargar esse trabalho a outras regiões da
bacia do Mediterrâneo, não sendo de excluir uma eventual nova candidatura ainda
mais alargada.
No projecto de decisão elaborado pela UNESCO depois de analisada a
candidatura – que fora apresentada na sede da organização em Paris em Março de
2012 –, é salientado que “a dieta mediterrânica envolve uma série de
competências, conhecimentos, rituais, símbolos e tradições ligadas às colheitas,
à safra, à pesca, à pecuária, à conservação, processamento, confecção e, em
particular, à partilha e ao consumo dos alimentos. Comer em conjunto é a base da
identidade cultural e da sobrevivência das comunidades por toda a bacia do
Mediterrâneo. É um momento de convívio social e de comunicação, de afirmação e
renovação da identidade de uma família, grupo ou comunidade”.
A transmissão destes saberes e práticas de geração em geração na criação de
uma identidade cultural e social, a sensibilização para a necessidade de
consumir produtos saudáveis, a salvaguarda desta cultura através de medidas e
legislação adequada foram outras razões apontadas para a classificação."
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