A julgar pelos polícias, lá em cima, podia ser um filme de Constantin Costa-Garvas. A escadaria e os leões podiam ser da Odessa de O Couraçado Potemkine de Eisenstein.
Lisboa saíu à rua ontem à noite para ver cinema português frente à Assembleia da República. As escadarias de São Bento transformaram-se numa enorme plateia onde populares se juntaram à comunidade cinematográfica, para protestar contra a inexistência de concursos de apoio a produções.
Assim, enquanto filmes portugueses são premiados nos mais importantes certames internacionais, o Estado corta em 100%, facto exclusivo da actividade cinematográfica. A Tóbis fechou o laboratório e foi vendida, o ICA está em ruptura financeira e isso significa - ou pode significar - o fim de várias casas de produção e outras empresas associadas ao audiovisual. Muitos desempregados - mesmo muitos - resultariam de tal situação.
Não admira pois, que a Associação Portuguesa de Realizadores tenha escolhido o local que escolheu para mostrar ao Poder o que não pode de maneira nenhuma acabar. José Nascimento e Patrícia Saramago trabalharam numa montagem de imagens de cerca de quatrocentos filmes portugueses. Recorreu-se às cassetes e DVD's de cada um, e os logotipos da RTP ou da Cinemateca Portuguesa eram bem visíveis, o que não foi confortável para todos. Mas guerra é guerra e na guerra vale tudo, até porque as duas entidades são tuteladas pelo Estado.
Os aplausos sucediam-se com a projecção das imagens dos actores mais estimados ou dos realizadores mais admirados, com destaque para o recém-desaparecido Fernando Lopes; e o blog aplaudiu silenciosa e solitariamente o cinema em Tavira, com Marisa Cruz fascinada com Marilyn Monroe no Cine-Tavira.
Mas o maior aplausofoi sintomático. João César Monteiro é interrogado na esquadra de polícia sobre com que finalidade quis tomar conta de um quartel. Monteiro, com sonora palmada no tampo da mesa, responde: "Marchar sobre São Bento!"
LG